2010/02/10

Se a tua mãe fosse lésbica, mudava alguma coisa?


Se a minha mãe tivesse sido lésbica...


Seria uma mulher de trabalho, como sempre foi. Não teria que prestar contas e dever obediência a um marido prepotente e autoritário que só lhe deu verdadeiramente valor após 35 anos de casamento.

Não a teria encontrado inúmeras vezes a ensaiar discursos - que nunca chegava a ter - ao espelho da casa de banho. Quando alguém lhe pisasse os calos diria de sua justiça e pronto.

Seria dona da sua vida. Não lhe aparecia um carro à porta acerca do qual, a sua opinião nunca foi tida nem achada.

Quando os filhos começassem com ciumes parvos uns dos outros, intrigas e afins, provavelmente daria um par de berros a cada um e diria para nos entendermos. Não seria obrigada a ficar calada, ou falar às escondidas, porque "há coisas que não devem ser alimentadas, não devem ser faladas", estabelecendo-se o culto do "segredo".

Quando os filhos se casassem, daria (como deu) cestas e cestas de viveres para encher a dispensa, na difícil fase que é o começo de vida a dois. Às claras porém. Sem ter de esconder do marido.

Não teria que governar a casa com uma magra mesada de 20 contos, mesada essa que só muito recentemente foi actualizada. Não teria que pedir dinheiro para comprar uma roupa, ou comprar uma prenda para os filhos ou netos.

Teria arranjado um tempo para, de vez em quando, ir passear com os filhos à doca, ver o pôr do sol, como idealizava em solteira. Em vez de ficar em casa, fazer o jantar, comer, deitar as crianças e ainda ir fazer trabalhos domésticos até se ir deitar.

Não se teria desgastado tanto, fisicamente e emocionalmente, para poupar o marido.


Em relação aos filhos? Amaria-os muito, defenderia-os como uma leoa. Cometeria erros como qualquer mãe. Isto manter-se-ia inalterável.


Este post resulta de uma brainstorm individual, provocada pelo cartaz da campanha publicitária anti-homofobia da ILGA. De facto mudava muito. Mas nunca o amor que nos une.


PS- sim, tenho perfeita consciência que este post revela o quão zangada eu estou com o meu pai.

11 comentários:

Lana disse...

me arrancou um longo suspiro.

Unknown disse...

O teu texto deixou-me com lagrimas e e o espelho do que se passou e passa em muitas casas, onde a mulher e super dependente do marido para tudo e mais alguma coisa. Va la que isto esta a mudar a olhos vistos e tenho a certeza que sera para melhor.

Beijinhos

Unknown disse...

Cacahuete e a SGFiltro, lol!

aNa disse...

isto vai ter resposta em post!

Unknown disse...

…faz-nos pensar; e tal como alguém já referiu, também a mim me deixou com uma lágrima no olho.
Beijos
Valisk

AlmaAzul disse...

Tenho de concordar com o Post da aNa.
Tudo isso é possível( Infelizmente) independentemente da orientação sexual.

Quanto ao teu pai, tenho duas ideias que partilho contigo:
- Primeiro nós não podemos escolher os nossos pais.
- Segundo, podemos aprender com os nossos pais ( e com todos os outros) , não para sermos como eles mas para não cometermos os mesmos erros que eles.

photoarte disse...

Nina o que descobri com os anos, é que vivenciar o tempo nos faz mais doces , e aprendemos com a maturidade a perdoar.
E como é bom perdoar, a alma se liberta, voa...
Queria lhe abraçar com muito carinho agora, e lhe disser bem baixinho: voe....
Mas tudo tem o seu tempo, e com certeza vc viverá o seu .
E seu tempo vaí ser muito mágico, pq vc fez o seu destino.
Vc escolheu a sua familia, as suas meninas.
Beijos ternos e meu carinho sincero.
mineira
Fíquei muito emocionada, voltei em mutas lembranças....

João Sabino disse...

Já vi que em vez de uma "mãe" lésbica sentiste falta é de um pai que soubesse ser verdadeiramente pai e verdadeiramente marido. Julgo que por a tua mãe ser, hipoteticamente, lésbica assumiste que não terias pai.

Oh Nina, então e se o teu pai fosse gay, mudava alguma coisa?

lr disse...

Nina, provavelmente li este post tardiamente, ainda não li o seguinte nem o comentário da aNa...
nessas coisas todas que enunciaste, e bem, a diferença chama-se patriarcado e não lesbianismo. só isso. e os efeitos do patriarcado estão da maneira mais tortuosa dentro de cada pessoa, e paradoxalmente, em muitas mulheres.
tecnicamente, a campanha está mal feita - filho/a e mãe têm um entendimento próprio e esse entendimento não é um problema social. a campanha devia começar, penso eu, por questionar: e se a sua maior amiga/a sua melhor colega fosse lésbica, isso mudava alguma coisa? - não mudava, como ainda hoje constatei.
um abraço, amiga (porque acho que compreendi...)

Nina disse...

Lana, pois é...

Cacahuete, temos que trabalhar para isso.

Valisk ...

AlmaAzul, sim, eu não discordo da aNa, ao contrário de que possa parecer. Foi uma ganda misturada, com muita emoção à flor da pele e olha no que deu... Quanto ao aprendermos para não cometer os mesmos erros.. (pano para mangas) isso é bem mais difícil do que se possa imaginar. O mais frequente é cometer os mesmos erros inconscientemente e no momento seguinte reconhecer o padrão, situação e verificar que lhes seguimos as pegadas.

Mineira, Obrigada pelas suas palavras... ultimamente tenho-me sentido pouco doce... tenho momentos. Mas estamos aí, né? Pelo direito a criar magia na nossa vida. Obrigada.

Oh João Sabino, diga-me Você, que pelos vistos me conhece tãooo bem.

LR, Concordo (patriarcado). Fiz uma grande salganhada, mas que se há-de fazer... está feita. Obrigada por compreenderes.

A todos os transeuntes, reservo o direito de censurar comentários, como aliás acabo de fazer.

Unknown disse...

Se a minha mãe fosse verdadeiramente lésbica, eu nao tinha nascido...